Sonho ou pesadelo?
Galera, nesse artigo gostaria de comentar um pouco mais sobre instrumentos Vintage. Já fiz um artigo há muito tempo atrás sobre isso, porém tenho percebido que muitos músicos tem tido alguns problemas com a escolha desse tipo de instrumentos, que resolvi rescrever a respeito.
Há muito tempo que guitarra e contrabaixo Vintage são uma febre para muitos instrumentistas. A valorização do instrumento Vintage cresceu tanto que começou a se fabricar instrumentos com aspectos envelhecidos, e acessórios com características antigas, tudo para remeter o instrumento não só a um visual do passado, mas também a um timbre de época.
Pois bem! No meu terceiro livro,
Guia ilustrado da Guitarra II – Tudo sobre Captadores – justamente para que houvesse uma compreensão melhor sobre o que é Vintage, pesquisamos, da onde mais possivelmente se originou o termo Vintage.
Vintage é um termo criado na indústria de vinhos para definir a data da colheita. Esse termo é uma combinação de Vint (of the vine = do vinho) com age (time of Creation= idade). Desde então o termo Vintage é empregado por colecionadores de carros, moda, instrumentos, móveis, e outros, para representar uma peça antiga, original, e “amadurecida”, que tenha marcado época. [CLIQUE NAS FOTOS PARA AMPLIAR]
Não se pode negar que comumente, um instrumento antigo possua madeiras mais selecionadas, e de melhor qualidade. Isso porque antigamente havia menos restrições a seu uso, e uma oferta muito maior para a escolha. Outro detalhe importante é que o uso de adubos aceleradores de crescimento vem se tornando freqüente, desta forma então, árvores antigas possuíam um desenvolvimento mais natural. Como a propagação do som em uma madeira mais sólida e melhor desenvolvida proporciona melhores resultados, fica mais evidente que instrumentos antigos possuem uma melhor resposta sonora com relação ao seu corpo e braço.
E mais um detalhe importante – além da madeira melhor, o instrumentos antigo, já está construído há bastante tempo, e desta forma, se foi cuidado de forma devida, sua madeira está ainda mais seca e climatizada. Ou seja, menos sujeita a variações climáticas. Isso tudo proporciona uma estabilidade e sonoridade quase que incomparável.
Outro ponto determinante, é que com o crescimento mundial da população, houve um crescimento necessário da indústria, gerando uma automatização em quase todos os setores. Sendo assim os instrumentos, tiveram também sua fabricação automatizada, ou através de máquinas CNC, ou através de mão de obra de linha de produção, onde cada operante cuida de uma parte específica do instrumento, mas quase sempre sem conhecimento algum da obra como um todo.
Nesse processo, do ponto de vista da produção e do custo tivemos melhorias, contudo, com relação ao primor na construção, é questionável se houve algum avanço. Por causa dessa produção acelerada, o instrumento “Custom Shop” que por definição é aquele confeccionado de forma mais singular, em menor produção e com muito mais zelo, teve sua procura também aumentada.
Bem, então é fato que o instrumento ‘”Vintage” de verdade (original de época) possui características sonoras mais avantajadas. INEGÁVEL! Mas, também inegável que na época que fora projetado e construído alguns fatores também foram determinantes.
- Muito provavelmente fora construído baseado no uso, nas técnicas e no emprego que o músico conhecia, necessitava e utilizava nessa época
- Apenas o que se conhecia na época sobre tecnologia, precisão, e conceito de construção, pode ser empregado no instrumento.
- Os acessórios como ponte, captadores, e tarraxas, por exemplo, embora sejam coadjuvantes no resultado tanto sonoro quanto visual das características Vintage do instrumento, é certo também que eram confeccionados e projetados com a tecnologia e conhecimento também da época.
Então desta forma, podemos com toda certeza também afirmar, que muito embora eu dissesse acima, que o avanço na fabricação de instrumentos foi questionável no quesito “Arte”, na questão funcionalidade, precisão, desempenho, ergonomia, e tecnologia eletrônica, é extremamente notório o progresso conseguido.
Sendo assim, ficamos com um antagonismo quase que insolúvel, uma vez que os instrumentistas, que são os jurados e juízes desta questão, possuem como elementos determinantes para o julgamento do caso, o próprio gosto pessoal. Daí a razão do “Vintage” para muitas pessoas ser um paradoxo.
Mas vamos analisar friamente. Por exemplo, uma guitarra Vintage realmente original de época, embora detenha todas as incontestáveis vantagens sonoras citadas acima, possui limitações de uso e emprego bastante severas se o estilo de música e técnica a utilizar não for semelhante ao propósito e ao ano de fabricação do instrumento.
Uma guitarra Fender modelo Strato original anos 70, por exemplo, possui o abaulamento de sua escala (Radium) tão acentuado que se as cordas estiverem baixas, fica impossível dar um Bend, sem que o mesmo se trave na escala. Característica da época.
Os trastes comumente são muito baixos, tornando o instrumento desconfortável para vibratos, e bends. É claro que tudo isso pode ser corrigido, melhorado, modernizado, porém, embora o instrumento ficasse um “sonho”, no mercado pode perder o valor, pela mudança da originalidade e do propósito.
Quanto aos acessórios, pontes e trêmulos antigos possuem pouca ou nenhuma estabilidade de afinação se comparadas com as de hoje em dia. Captadores modernos muito menos ruidosos, e com mais opções de ligações e configurações.
Muitos artistas consagrados nacionais e internacionais customizam seus instrumentos de forma a ter todos os benéficos do instrumento Vintage, e toda tecnologia moderna, sem se preocupar com desvalorização de patrimônio. Querem na verdade valorizar o seu próprio som.
Eu acredito que sobre o ponto de vista da funcionalidade, customizar um instrumento Vintage, trazendo o para atualidade, é sem duvida a melhor solução no quesito desempenho.
Mas se gostar de instrumentos antigos originais é bom que também se goste do estilo de musica a que ele foi proposto, e tenha certeza que o artista precursor do estilo não customizava seu modelo para conseguir nuances originais e modernas para época.
O instrumento Vintage é uma moeda mundial. Tem seu valor garantido entre aqueles que o admira. Em contra partida para muitos é como uma Torneira antiga de ouro. Vale muito enquanto peça, e jóia, mas enquanto torneira, muito pouco, pela sua ineficiência. Para quem
Com relação as réplicas Vintage, ou comumente chamados de reedição, se não forem algo do tipo, Tecno-Retro, ou seja, de aparência antiga, só que, moderno e tecnológico, em minha opinião, não valem nada. Pois não possuem as características sonoras reais de um instrumento antigo, e também não possuem nem acessórios e nem a construção moderna. Ou seja, improdutivo, a menos que decorativo, ou cenográfico para eventos e shows. É o que eu particularmente penso.
Em minha oficina é muito comum músicos trazerem para regular, lindas reedições Vintage de Fender Strato, por exemplo, e pedirem para abaixar as cordas, ajustar os captadores, pois o instrumento esta sem “peso”, “estalando” demais, trastejando nos bends,.. – Não dá!!! – É característico do modelo! Se eu mudar essas características, perdeu se o porquê da reedição. Seria mais econômico e lógico, comprar um modelo atual, e pedir para o Luthier deixar com uma aparência, mais Vintage.
O contrário também é comum. Querer timbres de blues antológicos, em instrumentos com pontes com sadles em titânio, captadores ativos, trastes extra jumbo, etc. Tudo em um instrumento colabora para seu timbre final.
Quando a concepção ideal do instrumento é muito contrária em seus conceitos inerentes, a fabricação sob encomenda (Custom Shop) é a solução mais eficiente e menos onerosa.
Você terá um instrumento com o timbre esperado, e com a aparência que deseja. Ou seja, perfeito para você!
Abraços a todos, fiquem na paz, e até a próxima!! Edmar Luighi
Muito lúcido o artigo. Coleciono guitarras nacionais antigas e sei muito bem que, apesar de madeiras de qualidade e do excelente timbre devido ao tempo, a quase totalidade delas é deficitária para as técnicas atuais de execução do instrumento, por vários fatores. Então, ou você compra uma guitarra vintage e a reforma acintosamente (o que a descaracteriza) ou busca apenas restaurar para coleção, o que eu faço. Acredito existir atualmente uma valorização exagerada quanto aos instrumentos vintages, nacionais ou importados, tanto na provável qualidade do mesmo quanto nos valores de mercado. No frigir dos ovos, o produto novo acaba sendo mais vantajoso.
O bom senso e o equilibrio sempre é o melhor caminho!! Abraço!! Obrigado pela visita!!